quarta-feira, 31 de julho de 2019

Sempre sonhei e busquei outra coisa...


“Sempre sonhei e busquei outra coisa, com uma paciência de alquimista, disposto a sacrificar toda a vaidade e toda a satisfação, como se queimavam antigamente os móveis e as vigas do telhado para alimentar o fogo da Grande Obra.”.(Mallarmé – 1885) 


Aos meus alunos(as) - no dia que completei sete anos de magistério num Brasil de 2019 - que assusta todos os dias só em ler qualquer jornal...


A citação acima é de Étienne Mallarmé, grande poeta francês, e expressa seu desejo simples – mas profundo – de não desejar nada além do se grande sonho: ser um poeta e ter uma vida que não renunciasse ao seu sonho: viver de sua poesia...

Quando iniciei o curso de Direito, aqueles corredores largos, trajes sisudos, linguagem espectral, quase me desanimaram... Fui ao encontro de outras possibilidade de mundos e conheci o Professor Luis Alberto Warat, nele, e na vida acadêmica como proposta como uma “poesia ao mundo”, encontrei o que desejava no Direito.

A decisão pela vida acadêmica veio cedo – e me acompanha com o mesmo suspiro do poeta acima: “[....] com uma paciência de alquimista, disposto a sacrificar toda a vaidade e toda a satisfação [....].”.

Desde 2012 sou professora universitária de graduação, pós-graduação, além de um curso preparatório para mestrado UFC. O que tenho a dizer destes anos?

Os melhores anos de minha vida!

A sala de aula sempre foi o local da poesia – do desafio – do novo mundo, nada fiz ou faço sem essa esperança, agora dolorida...


Sigo aqui com o que posso fazer: agradecer à vida pelos alunos(as) que tenho e tive e para pedir que não percam a vontade de semear poesia no mundo:

Quanto ao caminhar de vocês:
Sigam a vereda da ética, da defesa da dignidade da pessoa humana, da valorização das pessoas pelo que são, não pelo que tem, da poesia como forma de viver a vida com beleza e transformem este mundo estranho, carrancudo e frio num jardim...

As sementes são as nossas ações. 
E eu tenho fé em dias em flor...

Hoje, precisamente hoje, percebo que o caminho está bem árduo: mas meus pés são fortes - eles caminham sempre lembrando do meu sonho de um mundo - um País, uma sala de aula, um local de trabalho e de viver melhores...

Eu continuo - caminhando - não esquecendo o sonho e não mentindo sobre as dores do caminho...




Do umbigo: o “círculo aconchegante”.

Do umbigo: o “círculo aconchegante”.

Não há menção em nós mais forte que a pele. No romance "A festa da insignificância" Kundera nos faz olhar de novo para história - seu foco: o umbigo. Essa brincadeira de nos fazer ver o encoberto é a mais bela declaração de amor à vida. Nosso umbigo ideológico? Göran Rosenberg, escritor e jornalista sueco, cunhou o termo que deu título à nossa conversa aqui: “Círculo aconchegante”. Este seria um um regime de aceitação, “intuitivo”, que nos acomoda num espaço inquestionável – talvez por isso relacionei este termo com o “umbigo”. Como estudioso da Democracia, sua fala, publicada em 2000 “La Nouvelle Lettre Internationale” aponta para a diferença naturalizada entre “nós” e “eles”. A maioria dos temas que precisamos enfrentar sofrem a asfixia deste “sentimento de umbigo”. Na aldeia global nosso umbigo é o centro do mundo. Se você tentar se desprender dele, sua marca vai te acompanhar... e te desafi(ar)!

[1]COLUNA: “Um pedaço d(e) palavra”.Desde o dia em que nos chamaram para marcar a nossa terra. A terra deixou de ser nossa. Parece estranho, mas é esse o nosso paradoxo: somos estranhos no ninho. Paredes cada vez maiores – castelos de esque(cimento). A hermenêutica dos dias nos desafina, por isto aqui estarão alguns pedaços de palavras - uma ponte –um olhar "global". 
[1]É professora teimosa: vai desdobrando vocabulários na sina de traduzir a vida. Professora universitária, mestre em ordem jurídica constitucional pela UFC (2013), advogada, fica tecendo pesquisa em hermenêutica dos direitos fundamentais e em ensino jurídico, porque, insiste, é lendo o humano que aprende mais. Faz tudo isso ouvindo música – e quem dirá que escrever não é “sinfonar”?   
[1]BARTHES, Roland. “O prazer do texto”. Tradução: São Paulo: Editora Perspectiva, 1987. Título original: Le Plaisir du Texte. 86p. p. 11.
[1]Aqui faço referência a um, dentre tantos, movimentos de escrituras pela cidade: “Beijo na Cidade”, de Sérgio Gouveia. 

ESCRITURA E ENCONTRO

ESCRITURA E ENCONTRO

Andávamos sem nos procurar, 
mas sabendo sempre que andávamos para nos encontrar. 
(COTÁZAR, Julio. O jogo da amarelinha.Tradução: Fernando de Castro Ferro. Título original: Rayuela.  p. 13)

Ileide Sampaio de Sousa[1]

Aescrituraé uma forma de marcar encontros com quem amamos. É interessante a proposta de Roland Barthes, de, por meio da escritura e leitura apaixonadas[2], montar uma nova forma societária: a “Sociedade dos Amigos do Texto”. Fiquei debulhando como nossa cidade tem irrompido em dois rios: festivais de arte pela palavra nos últimos anos – diria até que há festivais solitários. Paredes antes angustiadas de cinza tem sido “beijadas”[3]por um colorido de escrituras. Quem diria?Paredes que eram formas em monotom hoje ganham ares de páginas de livros. Entretanto, noutra margem, um discurso de caos generalizado tem se avolumado em nosso tecido social, prenunciando sempre um abismo maior que o outro (lembrando os antigos: Abyssus abyssum invocat). Em todas as instâncias há quem repita: é o fim. Lembro de Kafka, em sua “colônia penal”, com sua máquina de inscrever a sentença na pele do culpado. É doloroso. Às vezes ficamos circulando “argumentos-máquinas”, rasgando a pele alheia, culpando o mundo para nos salvar a todo custo. Uma expiação às avessas.Enquanto eu culpavao mundo pelas paredes cinzeladas, veio alguéme pôs uma escritura de encontro. Naquele espaço marcado agora pela escritura – não há máquina, nem culpa, nem cinza. Há escritura. Se juntarmos as duas margens do rio, ainda ouviremos pela cidade: estamos perdidos! A diferença é que, em cada esquina de escritura, teremos um reencontro marcadoAté!


[1]É professora teimosa: vai desdobrando vocabulários na sina de traduzir a vida. Professora universitária, mestre em ordem jurídica constitucional pela UFC (2013), advogada, fica tecendo pesquisa em hermenêutica dos direitos fundamentais e em ensino jurídico, porque, insiste, é lendo o humano que aprende mais. Faz tudo isso ouvindo música – e quem dirá que escrever não é “sinfonar”?   
[2]BARTHES, Roland. “O prazer do texto”. Tradução: São Paulo: Editora Perspectiva, 1987. Título original: Le Plaisir du Texte. 86p. p. 11.
[3]Aqui faço referência a um, dentre tantos, movimentos de escrituras pela cidade: “Beijo na Cidade”, de Sérgio Gouveia. 

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Revolução e evolução em vida e cultura: fragmentos teóricos para um designer cultural...

Revolução e evolução em vida e cultura:
fragmentos teóricos para um designer cultural...



No início era, como sabemos, o verbo. O verbo estava com Deus. Durante sete dias e sete noites ele tentou introduzir diferenciações binárias, ou seja, bits: dia e noite, céu e Terra, Sol e Lua, sem falar do bem e do mal.  (KITTLER, 2017, p. 305).
O mundo não passa de uma gangorra perene, onde todas as coisas se alternam sem cessar. (MONTAIGNE, 1999, p. 804).




Um alerta: "revolução" não significa o fim, nem "evolução", algum tipo progresso. O primeiro texto acima é uma paráfrase bem humorada da gênese criacionista. Richard Dawkins, zoólogo e darwinista, no seu clássico "O gene egoísta", aponta que a seleção natural pôs fim às grandes questões da humanidade sobre a origem da vida. Para este autor, "Nós somos máquinas de sobrevivência - robôs cegamente programados para preservar moléculas egoístas conhecidas como 'genes'" (2007, p. 31). Entretanto, vivemos o último paradoxo da evolução: a seleção natural não é mais um atributo incontrolável que limita a existência humana - a revolução tecnológica tornou o Homo Sapiens num "quase deus": só que, agora, corremos o risco, cada vez mais próximo, de perdermos o sonhado "sentido da vida". Agora estaríamos perto de experimentar o fim do Homo Sapiens - a revolução da inteligência artificial, a genética: "[.....] o Homo Sapiens está transcendendo esses limites. Está começando a violar as leis da seleção natural, substituindo-as pelas leis do design inteligente." (2016, p. 408). O sistema desenvolvido no Reino Unido parece aproximar o conceito de cultura com o conceito de "seleção natural". "Você estará aqui no futuro?", pergunta Rebecca Walton, em palestra proferida no Curso de Gestão e Políticas Culturais do Itaú Cultural (2017). Segundo ela, a visão britânica de mundo é pragmática, enxergando a realidade por meio de estatísticas. Neste sentido, e firmando plano estratégico em outubro de 2013, com validade de dez anos, o "Great art and culture for everyone", cultura é algo que deve, antes e acima de tudo: ser excelente e sustentável. Por este motivo, atribui conceitos mínimos de identificação do que é arte e cultura, para, por meio destes, possibilitar um fomento empiricamente sustentável. Ela apresenta uma paisagem estatística, não apenas de um financiamento planejado, mas de como os critérios para arte e cultura  são importantes para seu fomento de forma inteligente. Aqui no Brasil deveríamos aprender esta lição:  “Em nenhum país desenvolvido, a análise do desempenho da gestão cultural pública prescinde da “construção de paisagens” feita com rigor estatístico.”. (DURAND, 2013, p. 28). Teixeira Coelho, sugeriu, em palestra proferida no mesmo dia e local, que o contributo de Rebeca Walton pode ser caracterizado como um tipo positivo de: "darwinismo cultural". Antes que se milite contra esta afirmativa é bom que se pontue: o que se depreende do modelo britânico é uma forma, em fragmentos muito sólidos, de um design cultural: que espelha e inspira ações que se sustentem no tempo - desenvolvendo potencialidades e autonomias: “Nossa visão de longo prazo é que as organizações artísticas e culturais assumam a responsabilidade pelo desenvolvimento das habilidades de sua força de trabalho.” (2017, online, p. 31. Tradução livre da autora). Ou seja, cultura é aquilo que se planeja com acuidade, excelência e perenidade, gerando autonomia entre o sistema cultural e político, bem como entre seus atores. Ou, em certeira afirmação: "Cultura faz-se mais com planejamento do que com dinheiro."(COELHO, 2017). Se o último deus não é mais o Homo Sapiens, mas a sua capacidade de gerir modelos - designers - de ação, é chegado o tempo da substituição dos planos de cultura imediatistas, sazonais - que brincam com recursos públicos, pela paisagem sustentável de um novo designer cultural. À similitude dos organismo vivos, precisamos manter nossos pensamentos em equilíbrio homeostático com outros sistemas. Mia Couto, ao defender uma nova postura sobre o pensamento e seus limites, compara estes com o sistema biológico - só que com uma diferença, enquanto os sistemas biológicos possuem fronteiras vivas - permeáveis ou semipermeáveis - nós tendemos a construir sistemas de pensamento rígidos, cegos - tendentes à morte: “Todas as membranas orgânicas são entidades vivas e permeáveis. São fronteiras feitas para, ao mesmo tempo, delimitar e negociar. O “dentro” e o “fora” trocam-se por turnos. [….] O problema é que o nosso pensamento, ao contrário do restante das entidades vivas, facilmente se encerra em si mesmo. Não sabemos fazer paredes vivas e permeáveis. Erguemos paredes inteiras como se fossemos tucanos cegos. De um e do outro lado há sempre algo que morre, truncado do seu lado gêmeo.”. (COUTO, 2013, p.196, 197). É este o requisito indispensável em UK - o que denominam como resiliência cultural: "Por resiliência, queremos dizer a visão e a capacidade das organizações para antecipar e se adaptar às mudanças econômicas, ambientais e sociais, aproveitando as oportunidades, identificando e mitigando os riscos, e implementando recursos efetivamente para continuar a oferecer um trabalho de qualidade de acordo com sua missão.".(2017, online, p. 32. Tradução livre da autora). O sistema cultural em design é a última membrana que precisa ser construída para uma paisagem cultural que resista aos tempos. 

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Acredito que as perdas nos tomam de assalto, principalmente, no campo dos afetos.

Há alguma luta eterna, como na metáfora de Kafka - o Ele é pressionado por duas forças antagônicas: o passado e o futuro.


Esta agonia do “passado que não morre e do futuro que nunca chega”(Morin)
Também diz muito de nosso campo ferido pelas perdas

Lembro que, quando pequena, me perdi dos meus pais. Segundo me contam quando me acharam eu disse:”eu segui o avião no céu”.

Um avião se tornou por alguns instantes uma presença mais importante que meus pais numa praia. O que mudou de lá pra cá?

A idade nos faz, no campo dos afetos, valorizar as pessoas que nos mostram segurança, amizade, cuidado, etc

No tempo da miséria dos afetos, tempos “onfaloscópicos”(Maffesoli) o eu requer uma presença infinita do desejo - e qualquer sinal novo no céu pode gerar uma distração e nos fazer amargar perdas irreparáveis

Ditadura dos desejos - Força do futuro guerreando
Ditadura da segurança - força do passado

Na “lacuna” está o Ele.

Que nem é presente, é apenas Ele.

Não foi Kafka quem disse isso, mas Hannah Arendt, esta lacuna só será verdadeiramente um Presente se o Ele se impuser contra as forças do passado e futuro e lutar por sua liberdade

Mas, no campo dos afetos, o que é ser livre?

O medo de perder e de não ter vivido por manter - é sintoma

Signo

Na constelação dos nossos precipícios …