quarta-feira, 27 de agosto de 2014

"A PALAVRA": Como ela fala?




Sentada em sua sala de estar
caíam seus braços sobre um ombro cansado - 
era o sinal de que queria um  outro estado, outro recanto, outro canto - 
e nada lhe era outro - 
tudo que tinha era ela mesma e seus ombros - 
cansados ombros...

Começou a ler a obra mais recente de Milan Kundera: "A Festa da insignificância"...

Era uma pressa tamanha

Já lera outras obras do mesmo autor e, em cada linha, percorria tentando angariar AQUELA frase que a envolveria como um REFRÃO de uma melodia que estava muito além da vida

Mas, naquela nova obra, novo livro, a pressa seria sua maior inimiga

Seu marca texto começou a ser silenciado - a FRASE não surgia

Diálogos eram lidos de forma apressada - os nomes começavam a escapar pelos dedos

Onde estava, MILAN KUNDERA, onde estava O REFRÃO que arrimaria sua alma?

Eu comecei a ver uma proximidade quase RELIGIOSA naquela leitura: 

Querer OUVIR E VER rapidamente, 
clamando com anseio, 
sem aceitar que NADA AINDA VEIO
Acendendo velas e arremedos 
E a PALAVRA, o Deus que mais fala, teimosamente, não vinha

Pedi aquele livro emprestado de suas mãos

Folheei e propus que eu leria para ela todas as noites - caso assim concordasse

Ele negou de pronto!

Disse que, naquela mesma noite, abarcaria tudo...

Dias após, ligou para mim

Meu pedido era, enfim, aceito

E eu, que nunca tinha lido nada do KUNDERA, leria em voz alta e calma - para abrir os olhos daquela que tinha tanta sede de VER NA PALAVRA UMA REVELAÇÃO para alma

Já no começo ela pedia que repetisse o enredo inicial, anotou os primeiros nomes: Alain, Ramon, Charles, D'ardelo e Calibã...


Ela entrou em êxtase quando ouviu: "No meu vocabulário de ateu, uma única palavra é sagrada: A AMIZADE" p.30

Pediu que marcasse com seu marca texto e ficou se martelando: "Como não percebi que A PALAVRA estava aqui?! Como não a vi?!"

Enquanto ouvia seu martírio sobre a perda, só pensava em como aquele momento mudaria minhas leituras, começava a aderir à uma literatura mais refinada - que encontro é a vida!

Ela teve que perder - para que eu achasse..

Ainda maturava a ideia de um ateu chamar SAGRADO - UMA AMIZADE SAGRADA - um altar sem ídolos - uma igreja sem deus?

Era sobre isto que meus anseios lidavam - 
Não a perda de minha capacidade de ler BEM - se é que colher FRASES é uma leitura boa...

Enfim...

Combinamos, todo dia, dois capítulos - porque era livro pequeno e de capítulos também pequenos..

Nos dias que nada encontrava no texto - eu tinha que reler, várias e várias vezes

PARECIA que ela queria uma LEITURA ÚTIL do ponto de vista da COLHEITA DE FRASES e refrões...

Pensando na AGONIA dela, lembrei do narciso D'ardelo, personagem da obra, que sobre ele Ramon dissera: 

"Não entendeu NADA, e ainda hoje não entende NADA DO VALOR DA INSIGNIFICÂNCIA"P.23

Eu sei que esta página veio de antes, mas ela não a percebeu e eu também não queria injetar mais terror por mais uma perda de REFRÕES 

Havia, naquela obra, discussões sobre Stálin e seu ar esnobe e viral de soberba - fora chamado de: "marionete"...

MARIONETES seriam aqueles que viveram, lançaram nome na história (de forma positiva ou não) e, depois, teriam suas vidas e falas recontadas por outras pessoas - virariam MARIONETES dos homens do futuro... Historiadores ou não...

Alain queria recontar um fase da história mediante uma peça. Tinha em mente Stálin e o rebatizo da cidade da PRÚSSIA: Könisgsberg (onde nasceu o grande KANT), que , após a segunda guerra, chamou-se KALININGRADO. Em homenagem a KALININ, militante de Stálin naquela cidade, e que tinha problemas de incontinência urinária - em consequência de sua próstata.

Enquanto eu vou querendo ver o enlace da história - ela, e seu MARCA TEXTO, ainda não tinha colhido mais que duas citações - e me fazia repetir quantas vezes quisesse...

Se isso me agoniava? Não! Simplesmente aprendia com aquele passo apressado - lendo e relendo - a ouvia melhor...


Na obra, Alain defendia que a compaixão era possível, mesmo no coração de Stálin. Ver seu companheiro com aquela doença o fazia enternecer ao ponto de batizar uma cidade com seu nome.

Isso fazia seus colegas rirem de Alain.

Haveria coração ainda num homem que há anos bebe sangue e alma de outros?

Essa era sua defesa: "É preciso que o rebatismo se apoie num nome famoso através de todo o planeta e cujo brilho faça calar os inimigos! [....] Como entender então que Stálin escolha o nome de alguém tão nulo? [....] ela pensa com ternura no homem...". p. 39.


Devo dar uma pausa aqui para admitir: EU COMPREI O LIVRO E COMECEI A LÊ-LO EM MINHA CASA - COMPREI ATÉ MARCA TEXTO e me vi buscando, como num alinhavo, sentido em cada uma daquelas FALAS, mas para mim não era uma busca por refrões de sentido - era apenas para tessitura de entendimento daquela linguagem...

Mas eu JAMAIS diria isto - senão não aceitaria que eu continuasse lendo para ela...

Voltando à história da obra…

Alain chega a convencer seus amigos: mais vale um INSIGNIFICANTE que sofre dos mesmos sofrimentos de qualquer simples ser humano, que os grandes heróis que poucos homens podem experimentar histórias como as suas – --------- _

Ver a história de KALININ era se reconciliar com O ABSOLUTO desapego dos significados heroicos e 
alinhar-se com uma vida com significado mais MODESTO – por ser 
REAL.

Assim consentiu Ramon: “Você tem toda razão, Alain. Depois de minha morte, eu quero me levantar a cada dez anos para verificar se KALININGRADO continua sendo KALININGRADO. Se for esse o caso, poderei sentir um pouco de solidariedade com a humanidade e, reconciliado com ela, voltar para minha sepultura.”. p. 40, 41.

O batismo da insignificância ainda salvará a humanidade de TANTA PRETENSÃO E SOBERBA...


Muitos querem ser heróis para vidas alheias à sua: e KALININ queria apenas não urinar na frente dos outros...
Seu ato era simples, contidiano, sem significado heróico: digno de romper a dureza até de um ditador...

O que quebra a alma humana não são grandes homens e milagres inexplicáveis
O que verga a alma humana e GERA HUMANIDADE são atos SIMPLES - despretenciosos - insignificantemente BELOS.


Eu ainda continuarei lendo livros – e continuarei lendo livros para pessoas – isso não significa nada para ninguém – por este mesmo motivo: SIGNIFICA TANTO PARA MIM:

 LER E ESCREVER... 

AQUI...

ou na areia....

Até breve....






quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Hábitos de imaginação...


Habito em terrenos imaginados – imaginários de habitação

Correm aqui nas veias - correias - que prendem e laçam

Eu chamo um tanto 

e canto.... 


Eu fico andando nas páginas - areias em branco

Perguntando aos céus: "A que horas o barco chega?"

Quando rumarei para o curso do sonho?!

Aqui, em meio ao trabalho duro - [áspero muitas vezes] - fico teimando em desenhar na areia

Quem me vê 

Apenas observa uma mesa cheia de papéis e alguns livros - ou muitos

Pensam que estou só alí

Ledo - rápido - engano


Habito onde a rocha do sentimento mais alto possa erguer o meu melhor sonho: uma vida cheia significado

Vês páginas?!

Vejo areias em branco

Vês um coquetel de livros?!

Eu leio entrelinhas - eu rabisco rascunhos que não servem para absolutamente nada!


E se você lê meu blog - lê o que de mim é mais caro: a beleza esvaziada de vaidade

A beleza que tem apego apenas pelo coração do escritor que ora conversa contigo - ora, consigo...


Eu olho o dia

Abra a janela da alma!

Ele te ob(serva)!