Ela tinha a palavra inquebrável
Tudo que dizia era atestado
Jamais desconfiei ou desconfiaria
Mas aquele dia
O que ouvi dela
Me fez titubear
Ela afirmava:
"Eu peguei na minha alma!"
Parecia um apelo
Um relato de sonho, mas, nao!
Ela dizia isso de forma tão exasperada e certa, suava por todos os poros
Para entender toda aquela empolgação a perguntei:
"qual a forma?! O que mais sentiu?! Será mesmo eterna?! Será que todos os humanos a tem?!"
Ela nao queria muito detalhar, mas minha insistência a foi vencendo...
" E começou...
Eu estava quieta olhando um jardim
Só pensando sobre aquela gota de água e o jorrar de luz daquele sol sobre ela
A gota de água
O sol
Apenas isso
Só admirando um belo jardim
Senti como se minha alma se quebrasse
Como que um braço,
Mas a cisão foi tão grande
Que a senti distinta de mim
Eu
Em outro espaço
A alma se deslocara
Que loucura!, era só isso que eu pensava...
Vê-la daquele jeito
Partindo
Partida
Nunca tinha experimentado aquela sensação
Foi uma experiência incrível
Mas, também, bem estranha
Tinha apelidos
Tinha gritos
Ela tinha tantos barulhos
Ouvi uma voz
Que repetia a todo instante:
"Coloque seu ouvido sobre ela..."
"Quantas vezes coloquei o ouvido em conchas
Para ouvir um barulho de vento, de mar...
Mas colocar o ouvido assim
Na minha alma deslocada de mim?!
Fiquei com medo mesmo...".
O que fizemos de nós? !
Corremos tanto que nos desfizemos:
desconhecidos ..
Somos donos de uma alma pouco nossa
Cada dia quebrada
Quase pedindo para sair
Quase gritando:
"Pare aí! Me ouça!"
Não sei,
Mas aquela história estava inquietando tanta coisa em mim
A pedi:
"Conte-me mais...! Qual o peso de perceber o que estava sufocado, esquecido: um desconhecido teu - desalmado"
Ela chorou
E orou
E chorou
Misturava tanto pranto com algumas palavras...
Mas ela foi forte
Queria me contar tudo
Ela sabia que todos os seres humanos tem esse sentido próximo: a alma.
Por isso me contava com tanta emoção...
"Eu ouvi de dias que não se foram.
Nem iam nem vinham.
Ficavam apenas transitando num espaço que nao sei dizer...
Quando ouvia risos aos montes
Aqueles espaços eram ouvidos de forma mais suave
Quando os dias eram de choro
Eu quase ficava surda!
Aqueles desalmados co-habitantes da alma - eram sentidos vinham aos berros atropelar tudo..".
Ela então ouve outra voz:
"Toca! Abraça!"
Ela, impressionada, entorpecida, ousa, teme, tremula...
"Abraçar aquela alma cheia de nós?!
Mas aquela era eu!
Por que o medo?!
Medo de ruir?!
Mas já estava diante de si...
Nao dava mais para escapulir..
Comecei a tocar naquela visão
Quanto mais tocava ela ia se tornando mais clara, luminosa!"
Uma pausa:
A necessidade que temos de sermos ouvidos, abraçados: deve ser essa vontade de receber luz - divina luz do calor de um ouvido, olhar e toque sinceros... Antes de termos luz para ou outros devemos nos alumiar...
"Parecia meio dia!
A visão quase me cega!
Quando a abracei já nao via mais nada! Fui abraçá-la seguindo apenas a direção das vozes que se silenciavam..."
(choro copioso)
"Naquele meu abraço estava todo o sentido...
E nele sumiu a alma informe - distinta
Parece ter voltado ao seu ninho barulhento - enovelado..."
Chorando, eu também a abracei
Quis ver se a alma ainda lá estava
Sabia que aquela experiência tinha razões indizíveis
Que aquela visão tinha lições incomunicáveis
Por isso escolhemos um longo silêncio - de um longo abraço
"Todas as perguntas que fizeste sobre a alma. Só te digo uma: ela (ex)iste. Mas ela quer mais que isso, ela quer ser ouvida... Ela precisa que paremos de correr de nós. Estamos nos separando dela quanto mais fugimos de olharmos no espelho dos nossos olhos para vermos quem temos sido..."
Sabe,
Nao importava mais se aquela história tinha sido real ou se tinha sido um sonho, para mim aquela visão era real...
Saí daquela conversa olhando mais para mim
Tentando rabiscar um pouco o que sentia
Levando a mão aos olhos para colher ainda algumas lágrimas
Aquela alma, do lado de fora
Queria tudo:
Menos um alguém (des)almado..
Quem lê entenda...
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