terça-feira, 24 de outubro de 2017

"A criança e o gosto do sonho: do homo sapiens ao homo prospectos.".


"A criança e o gosto do sonho: do homo sapiens ao homo prospectos.".
(Um resumo de minha fala no VII Encontro Angústia DE Existir).
Eu queria falar de crianças, mas eu acho mesmo é que temos que ouvir o que as crianças tem a nos dizer. O que eu mais consigo sentir ao ouvir uma criança é que devo sonhar como elas.
Nascemos e pronto. Nos tornamos o homo sapiens – esse que seria o homem que sabe – o ser da razão. Mas a vida mostra o contrário: nascemos frágeis e extremamentes dependes do mundo que vivemos e do outro.
Um caso que chocou o mundo: Amala e kamala, encontradas numa floresta na Índia, uivando à noite, comendo carne crua ou podre, andando de quatro e sem o hábito de rir ou chorar – as “meninas lobas” que morreram pouco depois de saírem de ser habitat. (LEYMOND, B. Le development social de l’enfant et del’adolescent. Bruxelles: Dessart, 1965. p 12-14).
Casos como este nos chocam, porque espancam a ideia de que somos “sapiens”.
Edgar Morin prefere dizer que somos “Homo sapiens-demens”; ou seja, somos seres que possuem 50% sapiens e 50% demens – com uma zona desconhecida no meio.
O prêmio Nobel de Economia 2017, Richard H. Thaler, 72 anos, que criou a chamada Economia Comportamental, focando o humano, mais do que o racional: “A teoria econômica neoclássica precisava abrir os olhos para o fato de que seu estudo estava centrado na existência de uma “criatura mitológica” chamada Homo economicus. O mundo real é habitado por pessoas que nem sempre tomam as melhores decisões, ou as mais racionais. São simplesmente humanos.”(https://brasil.elpais.com/…/10/econo…/1507644381_971684.html).
Ou seja, a ciência esqueceu que o Homos não é só racional.
Há um problema nisto? Sim, há. 
O problema do que muitos chamam de “efeito manada”: 
"Uma estranha pulsão animal de fazer, pensar, falar como o outro. Curiosa viscosidade, essa do “entre si”, que faz que eu me cole ao outro. E já se sabe há muito tempo: asinus asinum fricat!"(MAFFESOLI, 2009, p. 21)
Dias que vivemos uma verdadeira virada moralista beligerante: brigas por causa de um quadro, uma apresentação artística, um museu – ninguém às ruas pela miséria, fome, exploração do trabalho escravo, a alteração do Código Penal Militar que, insanamente, foi modificado para permitir que Militares respondam não mais na Justiça Comum – Tribunal do Júri (que é uma cláusula pétrea - não pode ser alterada nem por Emenda à Constituição), ninguém nas ruas pelo que realmente importa – todos pela necessidade de padronizar, domesticar o mundo todo ao moralismo – como disse Maffesoli: “E já se sabe há muito tempo: asinus asinum fricat – Entre os burros é melhor se acomodar!"(MAFFESOLI, 2009, p. 21).
E não falo de burrice acadêmica – falo da burrice da violência fascista. Com suas falas rápidas, seus jargões de chofre. Quantos seguindo, cegos, pelo brilho do ouro e/ou da “moral”.
Olhar pra tudo isso me lembra Edgar Morin: somos mesmo “homo sapiens-demens”
"Homo sapiens e igualmente Homo Demens. Se pudéssemos dizer: somos 50% sapiens, 50% demens, com uma fronteira no meio, isso seria muito bom... … MAS NÃO HÁ FRONTEIRA NÍTIDA ENTRE OS DOIS. Sapiens e Demens são dois pólos."(MORIN, 2015, p. 53)
Minha fala hoje já anunciava: do Homo sapiens ao Homo Prospectus. Este último termo eu retirei de um estudo recente divulgado na matéria: “Não fomos feitos para viver do passado.”.:
“O que melhor distingue nossa espécie é uma capacidade que os cientistas estão apenas começando a apreciar: nós contemplamos o futuro. Nossa singular capacidade de prever criou a civilização e sustenta a sociedade. Isso habitualmente nos dá ânimo para encarar as coisas, mas também é a fonte da maior parte de nossas depressões e ansiedade, quer estejamos avaliando nossas próprias vidas ou nos preocupando com o país.Um rótulo mais adequado para a nossa espécie seria o de Homo Prospectus, porque crescemos quando consideramos nossas perspectivas. O poder da prospecção é o que nos torna sábios. Olhar para o futuro, consciente e inconscientemente, é uma função central do nosso cérebro grande, como os psicólogos e neurocientistas descobriram - um pouco tardiamente, já que no século passado a maioria dos pesquisadores acreditava que somos prisioneiros do passado e do presente.” (MARTIN E. P. SELIGMAN e JOHN TIERNEY. The New York Times, 19 de maio de 2017.).
Se pensar o futuro nos humaniza e, talvez, seja nossa marca mais essencial – mas não única. O sonhar deveria ser uma proposta essencial para o existir.
Onde estão as disciplinas para o sonhar?
Por que não temos no Curso de Engenharia, Direito, Medicina, etc:
a.O Sonhar – I
b.O Sonhar - II
etc.?
Eu venho tecendo, junto com 33 alunos(as) de diversas IES privadas, de diferentes cursos: Direito, Psicologia, TI, Biomedicina, etc. Este Projeto que colocamos o nome #AngústiaDeExistir, ele já existe há mais dois anos.
A ideia era essa: lembrem, nos discursos acadêmicos, de sensibilizar a pesquisa. E façam mais: lembrem de vocês sem esta casta higienizada dos temas “científicos”.
O Sonhar como uma criança e o lutar como uma mulher – podem ser os fatores que despertem este Homo Prospectus desta doença generalizada do medo do futuro que é a ansiedade.
Afinal: lá na frente terá sido apenas uma replicação de um sonho deveras vezes repetido-sentido-refletido nos dias vividos – dentro e fora das salas de aula.
É por isso que termino minha fala com Kafka.
“Um livro deve ser o machado com que se rompe o mar congelado dentro de nós”(KAFKA)
Eu queria propor um trocadilho para esta fala de Kafka – troque a palavra LIVRO por SONHO.
E diga isto todas as manhãs – principalmente naquelas mais cinzas:
“O SONHO deve ser o machado com que se rompe o mar congelado dentro de nós”(KAFKA)
Não esqueçam: somos Homo sapiens-demens-prospectus; portanto, sonhe como uma criança e lute como uma mulher...


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